domingo, 28 de março de 2010

Tributação sobre a Exploração Mineral: a CFEM e a falta de transparência na gestão de seus recursos

Pela extensão territorial e pela geodiversidade o Brasil tem sob a superfície enorme riqueza mineral. Com reservas de classes mundial nosso país detém posição destacada no quadro das reservas minerais no mundo. Como maior exportador mundial de minério de ferro e ligas de nióbio, além de petróleo, caulim, bauxita, ouro e rochas ornamentais, a produção mineral movimenta mais de R$ 6 bilhões por ano.
Pela Constituição Federal de 1988, todo recurso do subsolo é da União. O Ministério das Minas e Energia (MME) é o órgão que coordena a política mineral brasileira, tendo o Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM) como autarquia que promove o planejamento e estimula a exploração e aproveitamento sustentável das riquezas minerais.

Dentre as atribuições do DNPM está a edição de normas e fiscalização da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), previsto na CF 88 (Art 20, IX, §1º) e instituída pela Lei 7990/89. Este tributo é devido aos Estados e Distrito Federal, aos municípios e a órgãos da administração direta da União, como uma contraprestação pela utilização econômica de recursos minerais de seus respectivos territórios.

A distribuição das receitas apuradas com o recolhimento da CFEM se opera com (Dec. Presid. 1/91):
  • 23% para os Estados e Distrito Federal;
  • 65% para os Municípios;
  • 12% para o MME/DNPM (10%) e FNDCT (2%).
A alíquota da CFEM tem sua base de cálculo sobre o faturamento líquido da venda do produto mineral, variando de 0,2 a 3%. O faturamento líquido é obtido pelo total das vendas, excluindo-se as despesas de transportes e seguros, incidentes e destacadas no preço de venda do produto mineral e os tributos incidentes sobre a comercialização, conforme o decreto citado.

A Lei 8.001/90 determina a alíquota da CFEM, de acordo com o minério:
  • 3% para bauxita, minério de manganês, sal-gema e potássio;
  • 2% para minério de ferro, fertilizantes, carvão mineral e demais substâncias minerais;
  • 1% para ouro (exceto para ouro de garimpo, que é isento);
  • 0,2% para pedras preciosas, coradas, lapidáveis, carbonadas e metais nobres.
Para se ter uma ideia, em 2006 o município de Parauapebas recebeu mais de R$ 50 milhões, correspondente a 65% dos mais de R$ 77 milhões recolhidos da produção mineral no município, quase que a totalidade em extração de minério de ferro.

Avaliando os tributos que podem ser excluídos da base de cálculo da CFEM, Luis Wolf Trzcina discute que era cabível a dedução de PIS e Cofins, já que estas incidem sobre o faturamento da pessoa jurídica e não sobre a comercialização do produto. Contudo, a Instrução Normativa 6/2000 do DNPM, determina que PIS, Cofins e IOF (quando incidente sobre a venda do ouro, como ativo financeiro), além do ICMS, devem ser excluídos da base de cálculo da CFEM. Trzcina ainda considera que "no aspecto jurisprudencial, há o entendimento que a CFEM é uma receita patrimonial originária do Estado, já que é devida em contrapartida à exploração de recursos minerais, que constituem patrimônio da União Federal e que depende de autorização ou concessão do Estado. Assim sendo, perante o entendimento jurisprudencial, a CFEM pode ser entendida como um royalty, devido como ressarcimento pela exploração do patrimônio público, não devendo ser entendida como uma receita tributária. Por não ser definida como tributo, não podem ser aplicados à CFEM os princípios que seriam aplicáveis aos tributo."

Existem projetos de lei na Câmara e no Senado que propõem revisão das alíquotas (para até 8%), incidência sobre faturamento bruto, repasse para municípios vizinhos entre outras propostas.

Considerando que os recursos minerais são excassos e finitos e não são renováveis, a CFEM é um tributo tido como uma compensação a unidade territorial de onde é extraído. Daí que seu destino deveria ser prioritariamente para promover a diversificação econômica e o desenvolvimento regional. Mas essa não é realidade na maioria dos casos.

Eu concordo com a professora da Universidade de Brasília (UnB) e economista Maria Amélia Rodrigues Enriquez. Em seu livro "Mineração: Dádiva ou Maldição", fruto de seu doutorado, estudou a utilização da CFEM em 15 municípios de diferentes Estados. Em 8 deles a receita advinda da CFEM representava mais de 20% da receita total do município, o que denota grande dependência local em relação à atividade mineradora. O que chama a atenção é que o tributo é mal utilizado pelos municípios, sendo que um dos principais problemas, segundo a autora, é que a Lei 8.001/90 que regulamenta a CFEM não indica como os recursos devem ser utilizados visando a já referida diversificação socioeconômica e a redução da dependência da atividade extgrativa mineral que por si é exaurível.

Dada essa omissão da legislação alguns municípios optaram por estabelecer um sistema de uso da CFEM próprio. Dois municípios registrados pela professora vincularam a utilização da CFEM a um fundo, com aplicações como: concessão de empréstimos a empreendedores com juros subsidiados, construção de galpões industriais com cessão de direito de uso aos empreendedores, incentivo a instalação de novas empresas, construção de estação de tratamento de esgoto (ETE) entre outros usos.

O que acontece com muitos município que recebem sua cota-parte da CFEM é a incapacidade de dimensionar onde foram aplicados esses recursos. Na maioria dos municípios os recursos da CFEM entram num caixa único e se diluem nas despesas correntes ou são direcionados, total ou parcialmente, para fins previamente definidos. Eu também defendo que o uso da CFEM deve ser encarado como estratégico para o município para evitar a dependência da exploração mineral. Creio que um uso mais consciente seria destinar a maior parte do recurso para propostas aprovadas pelo Orçamento Participativo e o restante para projetos em infraestrutura, logística e transporte, crédito para empreendedores, qualificação profissional e outros projetos que visam o desenvolvimento regional e a diversificação econômica.


Uma revisão das alíquotas para aumentar o percentual da CFEM, por vezes chamado de "royalty do minério", e sua incidência sobre o faturamento bruto ou sobre o preço de venda pode ter positivo impacto no desenvolvimento dos municípios, mas antes ou simultaneamente é necessário exigir das prefeituras e unidades da federação TRANSPARÊNCIA no recolhimento e aplicação desse recurso. Fica difícil pleitear aumento da arrecadação se as prefeituras nem sabem dizer quanto da CFEM é usado e qual seu destino.

Para alguns, como o Deputado Federal Zé Fernando (PV-MG), a criação de uma Agência Nacional de Produção Mineral, assim como a agência de regulação do petróleo (ANP), seria decisiva para a fiscalização das mineradoras e a compensação dos grandes lucros que recebem com a exploração. Esse tema ainda precisa ser melhor debatido para mim, para evitar sobreposição de atribuições com o DNPM ou o próprio MME. Mas saber quanto vem e para onde vai a CFEM é imprescindível.

Um comentário:

  1. Olá Rubens
    Moro na cidade de Bom Jardim-PE, onde existe uma exploração de rochas ornamentais a céu aberto. Minha pergunta é: quais os impostos, benefícios ou compensação que a mineradora deve pagar ao município?

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